Doping e o Esporte: testes e controles no desempenho de alta performance
13 min de leitura
O que é o doping?
O doping é o uso de substâncias, drogas ou métodos ilícitos usados para melhorar o desempenho esportivo. Esses métodos artificiais podem aumentar a resistência do corpo e dão vantagens competitivas físicas e psicológicas em relação aos outros adversários de forma totalmente desonesta. No entanto, colocam em risco até mesmo a vida do próprio atleta.
A prática de doping é uma questão muito séria e também difícil, repudiada pela sociedade, federações esportivas e pelos governos. Ela representa uma ameaça à integridade dos atletas “limpos”, a reputação do esporte e também o espírito esportivo.
Em época de Copa do Mundo e eventos esportivos de grande porte o assunto sempre volta à tona. Os competidores se submetem a qualquer coisa com a promessa de melhora do desempenho. Alguns utilizam suplementos nutricionais, outros agentes fisiológicos, como o doping sanguíneo, ou ainda certos hormônios e drogas.
Apesar de conhecido há muitos séculos, o doping vem sendo combatido com maior vigor apenas nas últimas décadas. Os testes antidoping para detectar esse tipo de substâncias nos atletas só começaram a ser empregados pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) em 1968, durante os Jogos de Verão e Inverno.
História do doping nos esportes
Há mais de 4 mil anos já era comum para os chineses o chá da planta “machuang” que tinha efeito estimulante. Seu uso aumentava a produtividade no trabalho, a disposição dos guerreiros no combate e também a performance dos esportistas.
Assim, a história do doping é mais antiga que a própria história dos jogos olímpicos. Os gregos usavam cogumelos alucinógenos para aumentar a sua performance desportiva. Da mesma forma, os romanos empregavam desde cafeína até o ópio.
O primeiro caso de doping relatado aconteceu em 1886, quando um ciclista inglês morreu de overdose numa corrida em Paris.
Os Jogos de Atenas, em 1896, marcaram o aparecimento das “bolinhas”, esferas contendo diversas substâncias estimulantes como cocaína, efedrina e estricnina. Daí o termo “usar bola” como sinônimo de dopar-se.
Nas olimpíadas de Berlin, os nazistas estimulavam a vitória a qualquer preço, usando todos os meios para alcançá-la e muitos atletas tiveram suspeita de doping. Na Segunda Guerra Mundial as substâncias eram usadas para aumentar a resistência de soldados e os anabolizantes eram dados aos prisioneiros desnutridos. Em seguida, houve um aumento significativo do doping em esportes de alto rendimento.
No entanto, foi apenas após a morte de dois atletas em 1960 e de 1964 por doping que o COI passou a controlar o uso desse tipo de substâncias no esporte. A partir de 1968, nas Olimpíadas do México, o exame antidoping passou a ser obrigatório.
Agência Mundial Antidoping
O uso de drogas que aumentam o desempenho cresceu nos anos 1970 e 1980. Foi então que uma iniciativa liderada pelo COI estabeleceu a Agência Mundial Antidopagem (WADA, em inglês).
Criada em 1999, a WADA é uma agência internacional independente composta e financiada pelo movimento esportivo e pelos governos do mundo, responsável por realizar o controle e testes antidoping dos esportistas.
Suas ações são orientadas pelo Código Mundial Antidoping, composto de políticas antidoping, regras e regulamentos dentro de organizações esportivas e entre autoridades públicas.
Um componente importante do Código é a “Lista de substâncias proibidas”, atualizada anualmente. Substâncias ou práticas são consideradas para inclusão quando se enquadram em dois dos três seguintes critérios:
- Há evidência de que a substância ou prática tem o potencial de melhorar o desempenho esportivo.
- Há evidência de que o uso da substância ou prática ameaça potencialmente o atleta.
- A substância ou prática viola o espírito do esporte.
Substâncias e práticas mais usadas
Anabolizantes
Agem como anabólicos da testosterona, aumentam a massa muscular, a força, diminuem a sensação de fadiga e também controlam o peso.
Os esteroides anabólicos facilitam a recuperação de sessões de treinamento muito extenuantes, permitindo que os atletas treinem duro nos dias subsequentes. Esse benefício potencial aguçou o interesse de atletas de quase todos os esportes. Geralmente são usados por corredores que precisam de explosão e força muscular, no atletismo e levantamento de peso.
Hormônios
Os hormônios estão envolvidos na maioria dos processos fisiológicos e suas ações são relevantes para muitos aspectos do exercício e desempenho esportivo.
Entre os anos 1950 e 1980, os agentes hormonais mais frequentemente utilizados pelos atletas foram os esteroides anabólicos. Na segunda metade da década de 1980, um novo recurso surgiu para substituí-lo, o hormônio do crescimento humano (hGH).
Outro hormônio que vem sendo muito utilizado é o EPO (eritropoetina). Secretado pelo rim, ele estimula a produção de eritrócitos (glóbulos vermelhos) na medula óssea. Dessa forma, aumenta a capacidade do sangue de transportar oxigênio, dando mais potência aos músculos para produzir energia. Usado por atletas de resistência.
Betabloqueadores
Estas substâncias podem diminuir o ritmo cardíaco em esportes nos quais a ansiedade e o tremor podem comprometer o desempenho do atleta, como tiro com arco ou armas de fogo.
Movimentos corporais são detectados cada vez que seu coração bate. Esse movimento é suficiente para afetar a mira de um atirador. A precisão nos esportes de tiro irá melhorar se o rifle puder ser disparado entre um batimento cardíaco e outro.
Os betabloqueadores são usados para manter as mãos mais firmes, alcançando uma maior eficácia.
Estimulantes
Essas substâncias estimulam o sistema nervoso central e podem até mesmo diminuir algumas atividades, como a sensação de fadiga e apetite. Usada para aumentar a concentração e o estado de alerta do corpo.
As anfetaminas são as preferidas, além de ter fácil acesso. Os atletas antecipam a obtenção de energia e a motivação e sentem-se mais competitivos para correr mais velozmente, saltar mais alto e adiar o início da fadiga ou exaustão completa.
Analgésicos Narcóticos
São derivados do ópio e aliviam ou diminuem a sensação de dor, a mais conhecida é a morfina. Esse efeito pode levar um atleta a menosprezar uma lesão potencialmente perigosa, agravando-a.
Diuréticos
São utilizados para retenção de líquidos e redução do peso, pois eliminam líquidos diminuindo o inchaço do corpo. Entre os que adotam essa prática estão os lutadores, jóqueis e ginastas.
Também é usado para mascarar e se livrar de outras drogas através da urina. Os atletas esperam que o líquido extra na urina dilua a concentração de drogas proibidas, o que diminuiria a probabilidade de detecção das substâncias ilegais em exames antidoping.
Drogas recreacionais
Essa classe tem sido amplamente utilizada por atletas tanto para a recreação como por suas possíveis propriedades de melhoria de desempenho. Embora possa ocasionar justamente o efeito contrário, em sua maioria, prejudicando a performance do atleta. Inclui o álcool, a cocaína e a maconha.
Doping sanguíneo
Assim como o EPO, essa prática aumenta o número de glóbulos vermelhos no sangue, fornecendo mais oxigênio aos músculos e melhorando o rendimento do atleta.
Uma prática cada vez mais frequente para induzir essa produção é a transfusão de sangue. Autóloga, se feita com o sangue do próprio atleta colhido com antecedência ou, homóloga, quando de outro indivíduo com o mesmo tipo sanguíneo.
No entanto, os riscos são grandes. Pode aumentar o estresse no coração, levar à coagulação no sangue e até mesmo causar um derrame.
Riscos para a saúde e efeitos do doping
Em busca do alto desempenho os atletas podem consumir substâncias ilícitas com a promessa de levar vantagem no seu esporte. Entretanto as consequências para o corpo e a saúde são muitas.
Há um motivo pelo qual os compostos e práticas ilícitas são proibidas, não apenas por denegrir o espírito esportivo e prejudicar uma competição justa, mas também por trazer riscos ao próprio atleta, inclusive de vida.
Confira alguns dos principais efeitos do doping no organismo:
Como os exames são feitos?
O controle do doping é realizado através do exame de urina ou sangue. Os exames podem ser realizados a qualquer momento, antes durante e após a competição ou prova, inclusive durante os treinos ao longo do ano, sem aviso prévio.
Os atletas com melhor desempenho geralmente realizam os exames para comprovar que não usaram nenhuma substância ilícita.
O Código Mundial Antidopagem é baseado em princípios de risco estrito, ou seja, os atletas são responsáveis por quaisquer substâncias em seus corpos, até mesmo se não souberem. Por isso todos os medicamentos, suplementos e alimentos devem ser cuidadosamente controlados pelos atletas.
Os testes para controle do doping são analisados em laboratórios acreditados pela Agência Mundial Antidopagem (WADA) para identificar o uso de substâncias ou métodos proibidos e incluem 5 etapas:
Seleção dos atletasPodem ser selecionados em competição ou fora de competição. O atleta pode ser selecionado por sorteio, com base na classificação obtida ou outro critério específico. |
|
Notificação dos atletasQuando o atleta for selecionado, um Agente de Controle de Dopagem o acompanhará o tempo todo, desde o momento da notificação até o final do processo, evitando a fraude no exame. |
|
Coleta das amostrasNo momento da coleta, o agente também acompanha o atleta para ter uma visão direta do fornecimento de urina. É necessário completar 90 ml de urina que será dividida em dois frascos “A” e “B”. O primeiro é a prova e o segundo a contraprova, para ser realizado um novo exame, caso seja acusado o doping. Para o exame de sangue é feito o mesmo processo. |
|
Análise da amostraAs amostras coletadas são enviadas a um dos laboratórios acreditados WADA. A amostra “A” será analisada de imediato e a amostra “B” ficará armazenada em local seguro, caso o resultado inicial seja contestado. Existem inúmeras substâncias e procedimentos proibidos pela WADA. A lista completa pode ser acessada aqui . Cada tipo de droga resulta ou altera um tipo de desempenho e para identificação e medição de cada substância, há um sistema analítico específico. Um dos métodos mais utilizados é de espectrofotometria que consegue identificar e quantificar as substâncias presentes na amostra. |
|
ResultadoTodo atleta que comete uma violação às regras Antidopagem pode sofrer as punições previstas no Código Mundial Antidopagem. Os casos comprovados, recusa em fornecer amostras ou outras violações previstas impõe ao atleta uma suspensão mínima de 4 (quatro) anos. Pode chegar até mesmo ao banimento do Esporte nos casos de reincidência. |
*Informações da ABCD – Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem
Copa do Mundo FIFA 2018
Na última copa, realizada no Brasil em 2014, todos os jogadores fizeram testes antidoping antes do início da competição. Foram 777 testes e mais de 232 durante a competição.
Não houve nenhum resultado positivo para doping no futebol. O último caso registrado em Copa do Mundo foi de Diego Maradona, em 1994.
Segundo a FIFA, para esta copa de 2018 na Rússia foram mantidos os mesmos procedimentos. Todos os jogadores foram testados antes da competição e durante os jogos serão recolhidas amostras após todas as todas as partidas, de atletas sorteados no dia do confronto.
Institucionalização do doping
Nos últimos anos, a Rússia, país sede da copa, recebeu um destaque negativo na mídia por conta dos escândalos de doping. Foram realizadas denúncias de doping institucionalizado, envolvendo atletas de todas as categorias do esporte sob o consentimento do Governo, incentivando o uso de substâncias ilegais e alterando os testes para promover a supremacia Russa nas competições.
O ex-diretor do Laboratório Antidoping de Moscou, Grigory Rodchenkov, delatou o esquema e a WADA deu início às investigações, sendo comprovadas posteriormente. A Rússia teve diversos de seus atletas suspensos dos Jogos Olímpicos do Rio-2016 e nos Jogos de Inverno de Pyeongchang-2018.
Houve a preocupação de que o uso de substâncias ilegais também tivesse atingido o futebol. “Todos os passos da Fifa são dados em comum acordo com WADA. Todos os jogadores foram submetidos a análises de sangue e de urina. Estamos fazendo tudo com uma atenção a mais por conta desse passado.” afirmou o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Segundo ele, não houve violação ao regulamento antidoping pelos atletas e a Rússia participa dos jogos.
Casos de doping no esporte
Ben Johnson
Nas Olimpíadas de Seul, em 1988, ganhou a medalha de ouro e ficou conhecido como homem mais rápido do mundo após quebrar o recorde mundial nos 100m rasos (9,79s). Mas uma amostra de urina pós-competição acusou positivo para esteroides anabolizantes. Ele foi destituído da medalha de ouro e suspenso por 2 anos. Com reincidência em 1993, foi banido do esporte.
Maradona
Maradona foi pego no antidoping mais de uma vez. A primeira delas, em 1991, quando jogava pelo Napoli da Itália, com resultado positivo para cocaína. A segunda foi em disputa na Copa do Mundo em 1994, pego no antidoping pelo uso de efedrina.
Lance Armstrong
Foi um dos grandes casos de doping no esporte. O ciclista americano venceu 7 vezes o Tour de France, a principal disputa do ciclismo mundial. Após alguns anos de suspeita, mas sem comprovações nos exames, ele admitiu ter usados substância e práticas ilegais nas competições. Ele perdeu todos os seus títulos e também não pode mais competir.
Produtos Kasvi:
Referências:
- KENNEY, W. Larry, WILMORE, Jack H., COSTILL, David L. Fisiologia do Esporte e do Exercício, 5th edição. Manole, 2013.
- MOREAU, Regina Lúcia Moraes. Ciências Farmacêuticas – Toxicologia Analítica, 2ª edição . Guanabara Koogan, 2015.
- Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem http://www.abcd.gov.br
- Convenção Internacional contra o Doping no Esporte http://unesdoc.unesco.org
- https://www.wada-ama.org
- https://sportsanddrugs.procon.org
- https://marcelrizzo.blogosfera.uol.com.br/2018
- http://www.efdeportes.com
- Icon made by Freepik from www.flaticon.com