Líquido Cefalorraquidiano: fatores pré-analíticos que influenciam sua análise
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O exame do líquido cefalorraquidiano (LCR) ou líquor vem sendo utilizado como ferramenta diagnóstica desde o final do século XIX, contribuindo, significativamente, para o diagnóstico de patologias neurológicas. Além do diagnóstico, a análise do LCR permite o estadiamento e o seguimento de processos vasculares, infecciosos, inflamatórios e neoplásicos que acometem, direta ou indiretamente, o Sistema Nervoso.
Características do líquido Cefalorraquidiano
O líquido cefalorraquidiano (LCR) é um líquido incolor, que circula o cérebro e a medula espinhal através do espaço subaracnoideo, ventrículos cerebrais e o canal central da medula. Por estar próximo e em contato com as estruturas cerebrais, é um fluido de alto potencial diagnóstico pela existência de biomarcadores para doenças neurológicas.
Apresenta peso molecular baixo e está em equilíbrio osmótico com o sangue, sendo constituído de pequenas concentrações de proteína, glicose, lactato, enzimas, potássio, magnésio e concentrações relativamente elevadas de cloreto de sódio. É produzido nos plexos coroides dos ventrículos cerebrais e no epitélio ependimário, sendo que 70% do LCR é derivado de filtração passiva do sangue e secreção através do plexo coroide.
As duas principais funções do LCR são relacionadas à homeostase: proteção e circulação. Ele constitui um eficiente amortecedor de choques para proteger o encéfalo e a medula espinhal de impactos. Em sua função circulatória, o líquido distribui substâncias nutritivas filtradas do sangue e remove as impurezas e substâncias tóxicas produzidas pela célula do encéfalo e da medula espinal.
Coleta de uma amostra
Uma vez que a coleta do LCR é um procedimento invasivo, só pode ser realizada por um profissional especializado (médico) e só pode ser realizado pós assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelo paciente ou por seu representante legal (Resolução n. 196 do Conselho Nacional de Saúde, de 10 de outubro de 1996).
A coleta da amostra de LCR pode ser realizada por três vias clássicas: lombar que é a mais utilizada na rotina. Faz-se a punção lombar entre L3 e L4, L4 e L5 ou L5 e S1 (espaços entre as vértebras lombares). Seguida pela suboccipital feita na região cisterna magna entre o occipital e a via ventricular feita diretamente em um dos ventrículos laterais através da trepanação da calota craniana.
As indicações para a punção podem ser divididas em quatro categorias das principais doenças: Infecção das meninges, hemorragia subaracnoide, malignidade primária ou metastática, e doenças desmielinizantes.
As indicações para a punção podem ser divididas em quatro categorias das principais doenças: Infecção das meninges, hemorragia subaracnoide, malignidade primária ou metastática, e doenças desmielinizantes.
As boas práticas na coleta do LCR recomendam a utilização de três frascos estéreis sem anticoagulantes onde, um será utilizado para análises bioquímicas e sorológicas, outro para exames microbiológicos e o terceiro para contagem celular. Dessa foram o primeiro tubo é destinado ao setor de análise bioquímica e sorológica, o segundo para o setor de microbiologia e o terceiro para o setor de citologia. Se a coleta for efetuada apenas em um frasco, deve-se realizar primeiro os exames bacteriológicos, seguido do hematológico/citológico e por último o sorológico.
As boas práticas na coleta do LCR recomendam a utilização de três frascos estéreis sem anticoagulantes onde, um será utilizado para análises bioquímicas e sorológicas, outro para exames microbiológicos e o terceiro para contagem celular. Dessa foram o primeiro tubo é destinado ao setor de análise bioquímica e sorológica, o segundo para o setor de microbiologia e o terceiro para o setor de citologia. Se a coleta for efetuada apenas em um frasco, deve-se realizar primeiro os exames bacteriológicos, seguido do hematológico/citológico e por último o sorológico.
Fatores pré-analíticos que Influenciam a Análise
Os principais erros laboratoriais relacionados à análise do LCR ocorrem na fase pré-analítica do processo laboratorial. Todo processo de análise do LCR deve ser estudado e compreendido por todos colaboradores para que tais fatores sejam minimizados e o potencial diagnóstico do LCR, preservado.
Identificação errada de pacientes, o transporte inadequado da amostra ou o uso de tubo incorreto para a coleta compreendem fatores passíveis de ocorrer em qualquer tipo de laboratório. Tais situações devem ser tratadas como não conformidades e consideradas para o aprendizado de todos os integrantes da equipe. A não identificação desses fatores ou não correção sistemática desses erros implicam o não seguimento das boas práticas laboratoriais.
Existem fatores pré-analíticos que influenciam a composição da amostra e análise, e podem ser divididas em 3 fatores. E a padronização é de extrema importância para se obter uma qualidade analítica consistente em que os resultados sejam precisos e reprodutíveis.
Fatores Relacionados à coleta de amostras
A punção para a coleta da LCR lombar deve ser realizada por médico especializado. São vários os objetivos dessa especialização: (1) realizar a correta interpretação do pedido feito pelo médico solicitante; (2) realizar a discussão do caso do paciente com a finalidade de orientar possíveis novos diagnósticos ou exames não conhecidos ou não solicitados; (3) realizar a técnica da punção perfeita a fim de minimizar a coleta traumática e, consequentemente, o aumento do eritrócitos na amostra (eritrócitos na amostra prejudicam a análise e, muitas vezes, diminuem a sensibilidade diagnóstica); (4) dominar o conhecimento sobre as contraindicações da coleta.
Fatores Relacionados ao Processamento Inicial
O volume da amostra coletada influencia a concentração de biomarcadores, a presença de células neoplásticas, a realização de determinados exames e uma possível repetição confirmatória desses exames. Muitas substâncias e células presentes no LCR tem gradiente de concentração craniocaudal. Se um volume pequeno é retirado, este representará somente a composição do LCR lombar / saco dural. Se uma amostra com 2 ml for comparada com outra amostra de 15 ml, esta última será muito mais fidedigna do LCR total e a análise da primeira pode promover resultados equivocados. Além disso, a sequência da amostra retirada do paciente pode influenciar a análise. Os primeiros 2 ml devem ser utilizados para a análise básica do LCR, enquanto o restante reunido e aliquotado no laboratório para o restante da análise. Não há relação direta entre volume de LCR coletado e cefaleia pós punção. O local da punção dever ser sempre documentado em razão do gradiente de concentração craniocaudal. A análise de um LCR ventricular ou um LCR subocciptal apresenta valores de referência diferentes dos de um LCR lombar.
O uso de tubos apropriados para coleta de LCR manufaturados com o material polipropileno também é um fator pré-analítico importante, pois essa substância apresenta baixo potencial de ligação com os as proteínas. Nenhum aditivo deve ser utilizado nos tubos e os tubos devem dispor de uma rosca para melhor vedação.
Fatores Relacionados às Condições de Armazenamento
O armazenamento e a temperatura ideal de amostra pré-analítica ainda são considerados assuntos que necessitam de mais estudos. Em uma pesquisa recente, a estabilidade de parâmetros de citologia e bioquímica (proteína, glicose e lactato) mantidos em temperaturas diferentes (4°C, 23°C e 35°C) foi analisada, com diferentes tempos de armazenamento: T0 – chegada ao laboratório; T1 – 1 hora após a chagada; T2 – 2 horas após a chegada; e os subsequentes T12 – 12 horas, T24 – 24 horas, T48 – 48 horas. De acordo com a análise estatística, não houve variação significativas nas concentrações de proteína e glicose até 48 horas. Quanto ao parâmetro lactato, ele manteve-se estável até 12 horas. Com relação à citologia, houve tendência de queda na média da contagem de todos os grupos celulares avaliados (contagem global: leucócitos e hemácias; contagem diferencial: neutrófilos, eosinófilos, linfócitos, monócitos, plasmócitos e macrófagos). A variação, no entanto, somente foi estatisticamente significativa após 12 horas. Os dados obtidos sugerem que as amostras de LCR permanecem relativamente estáveis nos seus parâmetros nas primeiras 12 horas. Contudo, deve-se sempre estimular a rápida chegada da amostra ao ambiente de análise, em condições pré-analíticas aceitáveis.
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Referências
- Atas de Ciências da Saúde – ANÁLISE DO LIQUIDO CEFALORRAQUIDIANO. REVISÃO DE LITERATURA – Alberto Andrade Leite, Sérgio Ricardo Honório, Gabriela Reimão Torres, Paolo Ruggero Errante – São Paulo – 2016
- Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial (SBPC / ML): Fatores Pré-analíticos e Interferentes em Ensaios Laboratoriais – 2018
- Análise dos valores de referência do líquido cefalorraquidiano